O
FRACASSO DA ESCOLA PÚBLICA E A VIOLÊNCIA NA PERSPECTIVA DO
CAPITALISMO BRASILEIRO E A CONSEQUENTE CULPABILIZAÇÃO D@S
TRABALHADOR@S
EM EDUCAÇÃO E/OU DA JUVENTUDE!
Desde que iniciei minha vida como
educando e posteriormente como educador se fala sobre a violência na
escola e de maneira cíclica se retoma a tese de que os jovens
estão mais violentos1
e são os responsáveis pela sensação de insegurança na escola.
Outra tese também defendida é a de que os profissionais que
trabalham na escola é que estão despreparados2
para lidar com os novos desafios da educação. As duas perspectivas
apoiam-se em elementos parciais da realidade para se legitimarem,
entretanto, não analisam a situação da escola pública na
totalidade dos seus elementos e tratam a violência de forma
descontextualizada em relação ao conjunto da sociedade brasileira,
paranaense e curitibana. O capitalismo é violento e a escola não
está imune a isso, culpabilizar @s educand@s e/ou @s trabalhador@s
em educação é um erro.
Historicamente a juventude esteve
relegada nos estudos acadêmicos e relegada a uma espécie de
invisibilidade social, sendo lembrada apenas quando da sua relação
com atos de “violência” na sociedade sendo que ela é a principal vítima como demonstra o mapa da violência de 2013. Sem falar na violência simbólica via o consumismo e outros elementos impostos pelas mídias capitalista hegemônicas.
Recentemente as instituições
sindicais, partidos políticos de esquerda, governos e organizações
civis têm tratado sobre o tema sob diferentes perspectivas. Nesse
sentido é importante refazer um histórico de como foi a tal
democratização do acesso à escola pública que veio combinado com
sua precarização no Brasil e no Paraná.
As bases das políticas educacionais
implantadas ao longo dos anos 1990 no Paraná, governo Lerner
(1995-2002), apoiaram-se nas diretrizes do BID e do Banco Mundial
como ponto de partida, mas também possuem sua gênese nos principais
pontos de governos anteriores (José Richa, Alvaro Dias e Roberto
Requião). Elas não tiveram exatamente o mesmo conteúdo, mas são
complementares e caminham na lógica da diminuição do papel do
Estado e na subserviência deste aos interesses do capital.
Nas décadas de 1980 e 1990 o
enfrentamento protagonizado por professor@s e trabalhador@s da
educação estadual foi muito importante para evitar o avanço
completo do projeto neoliberal, mas não suficientes. A educação
paranaense conviveu com perdas salariais, precarização das
condições de trabalho e das formas de contratação, rebaixamento
dos parâmetros pedagógicos e ataques à autonomia do coletivo
escolar.
No ano 2001, trabalhador@s da
educação estadual protagonizaram imensas greves, nas escolas e
também nas universidades e faculdades estaduais, mostrando para o
Brasil o descaso do governo Lerner com a qualidade da educação. No
ano seguinte, em 2002, Roberto Requião é eleito governador
colocando-se como oposição ao projeto lernista. Este governo se
caracterizava pela forte cooptação das organizações dos
trabalhador@s e de especialistas em educação de instituições
importantes como a UFPR, que ficaram “encantados” com a retomada
de concursos públicos, livro didático público, patrulha escolar
etc. Requião foi inteligente e conseguiu criar um clima de avanço
progressista na educação, de forma até mais elaborada que o
próprio modo que Lula fez em nível nacional. Desta forma, no Brasil
e no Paraná a hegemonia PT-PMDB permitiu ataques aos trabalhadores.
Quando estes se movimentaram, foram rechaçados pela maior parte dos
sindicatos e dos acadêmicos comprometidos com o governo estadual.
O retorno do grupo lernista ao
governo do Estado nas eleições de 2010, com a eleição de Beto
Richa caracteriza-se como a implementação mais descarada e direta
do projeto neoliberal, mas nas recentes mobilizações do mês de
junho, a falta de educação pública e de qualidade esteve presente
em várias das faixas e cartazes levados às ruas pela juventude e
pel@s trabalhador@s nas cidades grandes e médias do Paraná.
É imprescindível que entendamos que
a juventude e @s trabalhador@s estão de mesmo lado na defesa da
educação pública, de qualidade e com caráter emancipador. Devemos
atuar nos movimentos de educação em todas suas frentes, tanto na
defesa das pautas econômicas, como melhores salários e condições
de trabalho, como na defesa um projeto diferenciado de educação,
que rompa com as amarras do capital.
Somos, em diferentes momentos, atores
diferentes em conflitos sob perspectivas variadas: como professor(a),
como educador@, como pai/mãe, como educand@, como morador@ do
bairro, como marido, como esposa, como filh@ etc. Vivemos num sistema
interdependente e representamos diversos papeis, mas temos que
integrar as diferentes lutas por dignidade (no trabalho, no local de
moradia, na saúde, na educação, no campo, na cidade etc) sob o
aspecto de classe social que nos une (Somos todos proletári@s!). É
fato que a segurança pública no capitalismo é resumida à
repressão seletiva3.
Portanto, sejamos crític@s, a tal lógica, para superar a sensação
de insegurança através da efetivação da dignidade do seres
humanos, assim aumenta a sensação de segurança para todos sem
falsos maniqueísmos entre aqueles que compõem a mesma classe que
sofre sob o capitalismo.
ANÁLISE
DO CONFLITO COMO FENÔMENO SOCIAL E SOCIALIZANTE INTRÍNSECO ÀS
RELAÇÕES ENTRE OS SERES HUMANOS A SUPERAÇÃO DO MITO DA
POSSIBILIDADE DA SUA INEXISTÊNCIA COMO CONTRIBUIÇÃO AO DEBATE NO
ESPAÇO ESCOLAR PARA CONSTRUIR UMA UNIDADE ENTRE OS JOVENS, OS
PAIS/MÃES E OS TRABALHADOR@S NA EDUCAÇÃO PÚBLICA
O
conflito tem natureza sociológica e de acordo com Simmel
(1983) trata
sobre
a relevância e
sua capacidade de
alterar
agrupamentos sociais formados por interesses diversos
e o encara como
mecanismo coadunado
para solucionar “dualismos divergentes” e
para ajustamento
de uma unidade. Também
ancora
pertinência científica do
conflito como esclarecedor
das
sociedades reais e não das
imaginadas.
As sociedades reais são os
agrupamentos sociais que
se constituem numa correlação de forças opostas que interagem
entre si e se manifestam numa síntese integralmente harmônica.
O
conflito, em seus diferentes
níveis, tem importância
sociológica porque produz ou modifica os grupos de interesse
existentes nas sociedades reais, ele
é uma sociação que, apesar dos fatores de dissociação serem as
suas causas, funciona como ferramenta para solucionar dualismos
divergentes e construir unidade. Os aspectos opostos que constituem o
conflito, formam uma unidade que é salutar, mas
a sua compreensão não será
clara através do
conceito de unidade porque é a negação dela. Portanto, uma
classificação mais abrangente
caracterizará relações de unidade e as que contrariam-na.
Entretanto, efetivamente ambas realizam-se conjuntamente. Além
disso, o conflito antecede a unidade, perfaz diversos ínterins dela
e na realidade constituem um todo afinado.
Assim
como o universo precisa de 'amor e ódio', isto é, de forças de
atração e de forças de repulsão, para que tenha uma forma
qualquer, assim também a sociedade, para alcançar uma determinada
configuração, precisa de quantidade proporcionais de harmonia e
desarmonia, de associação e competição, de tendências favoráveis
e desfavoráveis. […] discordâncias não são […]
meras deficiências sociológicas ou exemplos negativos. Sociedades
definidas, verdadeiras, não resultam apenas de fatores negativos que
não atrapalhem. Esta concepção
comum é bem superficial: a sociedade, tal como a
conhecemos é o resultado de ambas as categorias de interação, que
se manifestam desse modo como inteiramente positivas.
(SIMMEL, 1983, p.124, grifo
nosso).
Portanto,
existem “tipos de
interação” que, da sua soma, formam a realidade e,
apesar da aparente irreconciliabilidade, formam um todo coerente.
Portanto,
há um duplo sentido, por exemplo, para o conceito de “unidade”:
um como oposição às discordâncias; e outro como síntese total
das relações “estritamente unitárias” e das “duais”.
Também há duplo sentido para o conceito de “discordância”:
um associado
a algo prejudicial; e outro associado a algo benéfico. Isso
acarreta imprecisões, mas
tal dualidade atua num dinâmica mais
ampla.
Os
elementos negativos e duais jogam um papel inteiramente positivo
nesse quadro mais abrangente, apesar da destruição que podem
causar em relações particulares. Tudo isso é muito óbvio na
competição de indivíduos no interior de uma unidade
econômica.(Ibid., p. 126, grifo nosso).
As
relações de conflito, amparadas por forças agrupamento, afirmam
uma estrutura social. Elas moldam uma unidade dinâmica e real.
Diante disso, os homens constituem vínculos por vários elos, mesmo
que a ciência busque o específico ao poder de coesão. Portanto,
muito do que parece irreconciliável e antagônico não o é de fato,
mas apenas como critério didático4
se separam.
Provavelmente
então, muitas vezes […] correntes convergentes e divergentes no
interior de um grupo […] sua motivação e sua forma inteiramente
coerentes consigo mesmas e apenas para conseguirmos descrevê-las e
compreendê-las nós as mostramos, post factum, em duas
tendências, uma monista, outra antagonista. (Ibid., p. 130, grifo do
autor).
Outro
elemento é que o
antagonismo que por si só não produz socialização, mas está
sempre presente no processo de constituição dela. Ele pode ganhar
um caráter que impedirá ou suprimirá os elementos convergentes.
Certamente
há conflitos que parecem excluir todos os outros elementos […] Se
essa luta visa simplesmente a aniquilação […] a mistura com
elementos unificadores é quase zero. Se há, todavia, qualquer
consideração, qualquer limite à violência, aí já existe um
fator socializante, mesmo que somente enquanto qualificação da
violência. […] Porque onde as partes não se abstêm nem mesmo do
assassinato, da quebra de palavra e da instigação à traição,
destroem a confiança na mentalidade do inimigo, que só ela permite
a materialização de um tratado de paz que acompanhe o fim da
guerra. (Ibid.,
p. 132-133).
A animosidade pode engendrar a
própria convergência de interesses, porque a argúcia dos
contrastes é contributivo à base da resolução do conflito. Ao se
incorporar elementos contra-hegemônicos ao hegemônico há um
abrandamento dos primeiros.
Os elementos de análise apontados no
texto de Simmel (1983) são de grande relevância na nossa
compreensão do conflito presente na escola e em outros espaços
sociais. Na busca pelo princípio da dignidade humana como direito
sob uma perspectiva crítica5.
Portanto, compreendamos o conflito como algo a ser encarado com
método democrático e não estigmatizante para construirmos uma
sociedade melhor sem buscar bodes expiatórios6
para problemas sociais complexos decorrentes das contradições do
sistema social e econômico hegemônico.
REFERÊNCIAS:
CIRINO DOS SANTOS, J. Teoria da
Pena. Curitiba: ICPC/Lumen Juris, 2005, p. 35.
MIAILLE, Michel. Introdução. In:
Introdução crítica ao direito. 3. ed. Editora Estampa,
2005. p.16-30.
SIMMEL,
Georg. A natureza sociológica do conflito. In: MORAES FILHO,
Evaristo (Org.). Georg Simmel: Sociologia.
São Paulo: Ática, 1983. p. 122-134.
1
Exemplo da tese sobre o aumento da violência juvenil:
http://www.parana-online.com.br/editoria/cidades/news/679115/?noticia=EXPLOSAO+DE+VIOLENCIA+NAS+ESCOLAS+PUBLICAS+ASSUSTA
2
Exemplo da tese, equivocada, sobre o despreparo dos
profissionais:
http://www.gazetadopovo.com.br/vidaecidadania/conteudo.phtml?id=1364635&tit=Professor-preparado-e-arma-contra-briga-em-escola
3
O Direito Penal é um sistema dinâmico desigual em todos os
níveis de suas funções: a) ao nível da definição de crimes
constitui proteção seletiva de bens jurídicos representativos das
necessidades e interesses das classes hegemônicas nas relações de
produção/circulação econômica e de poder político das
sociedades capitalistas; b) ao nível da aplicação de penas
constitui estigmatização seletiva de indivíduos excluídos das
relações de produção e de poder político da formação social;
c) ao nível da execução penal constitui repressão seletiva de
marginalizados sociais do mercado de trabalho e, portanto, de
sujeitos sem utilidade real nas relações de produção/distribuição
material, mas com utilidade simbólica no processo de reprodução
das condições sociais desiguais e opressivas do capitalismo
(CIRINO DOS SANTOS, J., 2005, p. 35).
4
Critério
que tem como preocupação a assimilação cognitiva, uma
compreensão inicial do assunto. Busca propiciar uma apreensão
inaugural do fenômeno, isto é, estabelecer uma ligação entre o
raciocínio do leitor e o conteúdo apresentado.
5
Crítica como método de
análise que fusiona a visão dialética e a capacidade de abstração
na apreciação das situações de litigantes.
6
O bode expiatório é o ator ao qual
imputar-se-á toda a culpa sobre um fenômeno amplo do qual ele é
apenas mais um elemento.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Sua opinião é muito importante. Obrigado.