segunda-feira, 16 de março de 2015

IMPRESSÕES SOBRE OS ATOS DO DIA 15 DE MARÇO DE 2015

Brasil afora centenas de milhares falaram e isso exige uma reflexão sobre o que ocorre. É preciso escutar e a partir daí se posicionar. O que salta aos olhos é que a situação exige uma mudança profunda. Mas nem tudo o que as ruas falam sugerem um bom caminho. As faixas em favor do golpe são um sintoma claro de que mesmo com milhares tomado as ruas, não se abriu um caminho progressista.
Não tenho dúvida de que a maioria dos que estavam nos atos não querem uma saída fascista e nem querem ser controlados por aparatos burocráticos. Por isso, Bolsonaro e Paulinho da Força Sindical foram hostilizados. As pessoas querem mudanças, mas para que a direita não ganhe na inércia é preciso avançar em um programa. A questão é que mudanças são necessárias e quem são os agentes desta mudança.
O que vimos pelo Brasil foram atos contra o governo Dilma e contra o PT que expressaram uma indignação geral contra a corrupção e a carestia. Entretanto, ao não ter uma ideologia crítica o que predominou foi a da classe dominante. É neste caldo que a grande mídia atua, instrumentalizando e direcionando.
Quando as ruas começam a ter mais peso que o Parlamento pode ser o sinal de uma mudança positiva. Entretanto, dezenas de milhares nas ruas não basta. É preciso um programa. E neste momento as ruas não indicam apenas um caminho. E se a estrada errada for a escolhida, ao invés de se progredir e superar a crise, poderemos retroceder e permitir que os grandes empresários, bancos, empreiteiras e corporações midiáticas façam valer sua agenda de defesa dos privilégios e de uma sociedade ainda mais desigual.
Os grupos que na manifestação defendiam a intervenção militar revelaram o sentido profundo de uma das tendências que este movimento pode promover se não se interpor a discussão de uma saída que não é fácil justamente porque ela exige enfrentar as classes dominantes.
O PT traiu a classe trabalhadora e foi muito útil à classe dominante, controlando as greves, protestos e sendo o agente de aplicação dos interesses econômicos da burguesia, deixando migalhas para o povo. Mas junho de 2013 mostrou que o PT já não tem mais esta serventia, a crise econômica exige um ajuste brutal contra os trabalhadores. É natural, portanto que a burguesia prefira governar através do seu filho legítimo, o PSDB. Mas seria cair em impressões falsas achar que a burguesia abandonou totalmente o PT. Basta refletir sobre o fato de que o PSDB defende a mesma política econômica que Dilma está aplicando e está envolvido nos mesmos escândalos de corrupção para perceber que eles não querem o impeachment. Como já disse FHC e Aloísio Nunes, eles querem sangrar, render totalmente o governo para garantir que o ajuste de Levy seja devidamente aplicado e os interesses do grande capital preservados neste momento de crise econômica.
É preciso compreender que as ruas por si só não garantem a soberania popular. É preciso dizer quais interesses fortalecem. E quais pontos de programa alavancam.
As propostas para superar a crise partem da necessidade de se combater a corrupção, apoiando as investigações da Lava Jato e defendendo a punição para todos os corruptos, seja de qual partido forem. Também é fundamental terminar qualquer possibilidade dos políticos esconderem sua evolução patrimonial. Precisamos de uma nova legislação na qual os políticos não tenham mais direito a sigilo bancário e fiscal. Igualmente, a lista dos sonegadores do HSBC deve ser revelada e os recursos resgatados.
A luta contra a corrupção não é suficiente. Na economia é preciso impedir que sejam os trabalhadores que paguem pela crise. Basta de arrocho salarial e de demitir trabalhadores para garantir o lucro. Basta de cortar recursos da educação e da saúde para manter o pagamento dos juros da dívida pública aos bancos e grandes especuladores. Basta de extorquir os trabalhadores com impostos e não cobrar o Imposto sobre as Grandes Fortunas bem como manter os privilégios fiscais dos bancos. É preciso fazer o ajuste nas costas dos milionários e promover o controle público das corporações privadas.
Ha uma crise de legitimidade geral, mas novas eleições simplesmente não resolvem porque somente sob novas regras, sem o dinheiro das empreiteiras e sem as desigualdades na disputa isso seria possível.
Esta alternativa só pode ser construída a partir de uma agenda de luta construída pela classe trabalhadora e pela juventude, nos locais de trabalho, nas escolas, nas universidades, lutando por democracia real e construindo um programa anticapitalista. O exemplo da greve dos servidores do Paraná, dos garis do Rio de Janeiro, dos caminhoneiros e tantas outras, é fundamental, pois este é o método de luta e o método de se construir uma oposição de esquerda. Estas lutas vão seguir. É desta forma que as ruas precisam falar.

Adaptado do texto de Luciana Genro. Disponível em: http://lucianagenro.com.br/2015/03/algumas-impressoes-sobre-este-dia/

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